Sunday, October 23, 2005

Os Inventores do Mal


Os homens que inventam uma arma, algo que pode inflingir a morte a milhares, milhões... O que lhes passa pela cabeça? Conviver com a sua obra, sendo um ser humano de consciência... Como se vive com isso? Dois nomes saltam à minha cabeça quando penso nisto.

Um é J. Oppenheimer. Este nome é o principal responsável pela Bomba Atómica. Líder de uma equipa que inventou a dita. Antes das suas próprias palavras, a primeira frase que foi dita aquando da primeira explosão controlada em Los Alamos Grandes, pelo número dois da equipa, do qual, infelizmente não me recordo o nome:

"That´s it... now we are all sons of bitches"

Imaginem o que passa na cabeça de alguém que inventa uma arma como estas. As dúvidas, as incertezas, a sensação de estar a fazer o bem pela mão do diabo. Porque tudo não passa de uma questão de contexto. À primeira vista, sem se pensar muito, é fácil dizer-se que, caso fosse connosco, nunca faríamos a bomba. Mas imaginem que a questão vos é posta da seguinte maneira: " Se não formos nós, são os outros, e é mais que certo que quem a tiver primeiro vai ganhar a guerra. Se forem eles, todo o mundo irá ficar debaixo das regras Nazis... voçê é Judeu também... voçê pode contribuir para a vitória do bem."

Eu próprio não sei o que faria. As nossas escolhas são filhas do que sentimos num determinado momento. Eu não o consigo julgar. Ao mesmo tempo Heisenberg, pelos Alemães, tentava executar exactamente o mesmo projecto. Era uma corrida para ganhar a guerra. Voçês tentem pôr-se no lugar deste homem, e vão ver que não conseguem distribuir o certo e errado tão facilmente.


O primeiro convidado a fazer a bomba foi a figura proeminente da física na altura, Einstein, judeu, furagido da Alemanha, acabado de pedir exílio aos EUA. No entanto, este disse não. Mas, é nas suas teorias que se baseia, e acaba por ser ele que a meio do projecto dá uma grande ajuda a que se complete. Agora, para efeitos históricos, na cabeça de cada um de nós, o seu nome não está relacionado. E eu acho que é isso que todos estes "bons infames" procuram.


J. Oppenheimer:
"I have no remorse about the making of the bomb and Trinity [the first test of an a-bomb]. That was done right. As for how we used it, I understand why it happened and appreciate with what nobility those men with whom I'd worked made their decision. But I do not have the feeling that it was done right. The ultimatum to Japan [the Potsdam Proclamation demanding Japan's surrender] was full of pious platitudes. ...our government should have acted with more foresight and clarity in telling the world and Japan what the bomb meant."

J. Oppenheimer sempre defendeu que que a decisão de utilizar a bomba não devia ser unilateral, mas em conjunto com quem mais combatia ao lado dos EUA, a Rússia. Também criticou a maneira como foi pedida a rendição japonesa, sem dar a conhecer o mal terrível que os esperava caso a resposta fosse negativa. O que valeu o intervencionismo... foi acusado de comunista no apogeu do anti-comunismo americano e despojado de todos os cargos que teve depois da guerra.

Ele criou o mal, mas destacou-se da destruição em si, criticando o modo como foi utilizada. Se calhar, se o Japão soubesse, nunca haveria bombardeamentos, mas se a bomba não fosse inventada, se calhar também, andaríamos hoje com uma suástica no peito, ou um número de série tatuado no braço. Apesar de ter sido dissidente, Oppenheimer não conseguiu afastar o seu nome da destruição... O primeiro nome, que vem à cabeça do ser humano comum quando vê o cogumelo atómico é o seu... é a maldição destes que, querendo fazer o bem, soltam o pior que há no mundo.

O meu segundo exemplo, a meu ver, é o exemplo de maior sucesso destes benfeitores malditos. Apesar de não ter muito impacto nos dias de hoje, a dinamite, foi usada durante muito tempo como arma de destruição também. Se contarmos todas as vítimas, de certeza o número deve ser maior que as provocadas pela bomba atómica até os dias de hoje.

A sua motivação era o benifício em obras civis e afins, que de facto, se veio a confirmar também. Claro que a Natureza humana se encarregou de usar a dinamite para matar e destruir.

Este homem, jurou que o seu nome nunca ficaria ligado à dinamite, que em vez disso, ficaria ligado a algo de bom, e seria recordado por todos como um benfeitor, em vez de alguém que criou uma arma. Com o dinheiro que ganhou criou uma fundação que prestigia o que há de melhor no mundo em várias áreas. Todos os anos ouvimos o seu nome, e ninguém pensa em dinamite... Carreguem aqui

Dar ao mundo novas ferramentas de trabalho, ou a arma da vitória não é condenável. É o modo como se utiliza que deve sofrer uma apreciação positiva, ou negativa. Não se pode pensar que estaríamos melhor se A ou B nunca fosse inventado. Isso é negar a própria Natureza humana que procura sempre a inovação e o melhoramento das condições que o mundo nos dá. Eu não penso mal destes homens... foram vítimas do seu engenho e dos tempos em que viveram... foram pessoas de consciência, aperceberam-se do que trouxeram ao mundo e tentaram mostrar-lhe que se pode fazer o bem, até com a mais letal das armas.

Gostava de saber a vossa opinião sobre a bomba, se a fariam ou não... Para envergonhados, o e-mail, mas gostava mesmo de saber o que pensam.

7 comments:

Anonymous said...

Em termos cientificos qualquer um pode "tropeçar"em algo que tanto pode melhorar a vida de milhares de pessoas como destrui-las. a questao da bomba atómica é o uso de conhecimento cientifico com fins belicistas. no fundo a decisao é politica... e como tal nao cabe aos Homens de ciencias a escolha do caminho a seguir. podemos também ver a questao de outra forma: se me pedirem para fabricar uma bomba, nao o faço por questoes morais. se o meu patrao me pedir para fazer uma bomba é esse o meu trabalho logo tenho de cumprir ou ir para a rua... trata-se aqui também de uma questao politica.
assim o nome do inventor nao deve ficar associado ao mal que a invençao provoca mas sim a quem promulga o uso da invençao.
abraços, vitor

Manandre said...

Mas Victor essa é mesmo a questão... Se estás em guerra e o teu patrão te diz para fazeres uma bomba, tu sabes o uso que ela vai ter... É esse o conflito que quero realçar, na cabeça de cada um.
É o choque entre os teus valores morais e o dever ao teu país e povo que teve Oppenheimer.

Mas comentário teu gostava de ter relativamente ao post da disciplina partidária...

Anonymous said...

a questaõ da guerra é de dificil compreensao pois nao me estou a ver neste momento numa guerra...
a questao do uso da bomba nao sou eu quem decide o uso da bomba ou nao, trata-se de uma questao politica e dos politicos que sao eleitos.
em termos de dever ao pais e povo... depende da visao que estas a ter do que se passa na altura...
a questao moral??? provavelmente teria a posiçao do oppenheimer. o dever em relaçao ao pais é para mim uma treta, no entanto em relaçao ao povo aí já pia mais fino. (aqui tenho de dizer que se trata tanto do povo do meu pais como o povo japones)
trata-se de uma quetao muito complicada esta da bomba atomica tendo em conta as circunstancias em que ela foi lançada. o erro no numero de baixas (em que foi retirado um zero ao numero de vitimas), a nao explicaçao aos japoneses do que era a bomba atomica (e os reflexos que ela iria ter), entre outros fazem com que a responsabilidade caia no podder politico.

vitor

Manandre said...

Mas a verdade é quem te pede é um país, e esse país que a pode utilizar, não é o teu povo... Porque devo-te dizer que apesar do tipo ser judeu, esse factor não terá pesado muito na decisão, segundo o próprio.
Tens toda a razão quanto quanto à maneira como foi utilizada, e a informação distorcida... Mas a verdade é que a guerra foi ganha, e isso para mim acaba por, de longe, o mais importante.

Agora, eu se fizesse uma bomba, saberia de antemão que esta seria utilizada, não se cria uma coisa daquelas, para se dizer aos 4 ventos que se tem, porque nao vao acreditar...

Mas digo-te, eu faria os mesmos comentários que o Oppenheimer, mas ao fazer a bomba eu contaria com a destruição por ela efectuada.

Porque tu sabes que a fazes e não és tu que mandas nela, tens que contar com o efeito que possa ter nas mãos dos teus governantes... E a maior responsabilidade está aí.

Ao cria-la estas a dar a possibilidade de ser usada e isso já chega.

Anonymous said...

vendo as coisas de uma forma simplista:
eu trabalho numa fabrica de automoveis de uma marca que vende muito no mercado.

anualmente morrem por todo o mundo milhoes de pessoas em acidentes dee automovel com os carros que eu produzo.

advirto todos os compradores dos cuidados que devem ter ao conduzi-lo.

a poluiçao produzida pelos carros que construo matam ainda anualmnente uns milhares de pessoas

e é por isto que eu vou deixar de construir carros???

estou a exagerar um bocado com este paralelismo parvo

a minha questao é so esta, o poder politico é eleito pelo povo. o povo se quiser ter um presidente parvo tem hipotese de o escolher (vejamos o caso do Bush).

a mim cabe-me tentar (e a ti) elucidar o povo para que tenha consciencia das ewscolhas que esta a tomar.

a guerra já estava ganha nessa altura e já há provas disso e as demonstraçoes de poder nao precisam de ser feitas obrigatoriamente nas duas maiores cidades de um pais

de facto é dar oportunidade de uso ao pais e aos seus governantes mas... acima de tudo é responsabilizar o povo pelas suas opçoes (e nesse aspecto o povo americano deveria ter alguma vergonha).

vitor

Manandre said...

Tenho que te dizer que essa comparação fez-me arrepiar os cabelos pá :)

Provas da guerra ganha... isso cheira-me a especulação, além disso o ultimato é feito e ridicularizado pelos japoneses... N sei se é tanto assim... Quanto à escolha de governantes... essa é para os copos também... os americanos acabam por ter um 8 a 8 repartido entre os dois partidos de alguns mandatos para cá. E o tipo acaba por ganhar face ao peso de alguns estados, não em termos efectivos... Os EUA são um país especial... Eu vou para lá amanha portanto tenho pensado nisto um bocado... Fica para os copos?

vicks said...

Parabéns André pelo blog. Mais parabéns ainda pela forma directa como interpelas o leitor. Acho que é o objectivo mais nobre que pode haver na escrita: por as pessoas a pensar. Comigo funcionou, reflecti e vou agora contribuir humildemente para esta interessante discussão.

Acho que os comentários anteriores já são bastante exaustivos no que concerne a vertente politica e até o paradigma moral subjacente à criação desta arma. Por isso, debruço-me sobre outros aspectos.

Como o André focou e frisou muito bem no post original, a questão terá de se pôr ao nível pessoal. A questão do André foi colocada no plano quasi-filosofico, moral e ético até. Eu vejo o lado ainda mais imediato, o lado humano real. O lado que dá de comer à sua familia, o seu prestigio profissional, carreira... e como se estava a adivinhar... o dinheiro!

Não sejamos inocentes ao pensar que o Oppenheimer passava os dias a pensar no binómio ciência/ética. Na cabeça deste investigador aposto que apenas estava fazendo o seu trabalho. Quando se trabalha num projecto desta dimensão, todos os dilemas "existenciais" deixam de existir. Este homem não se deitava à noite a pensar se iria contribuir para o bem da humanidade, deitava-se a pensar como conseguiria atingir a massa critica para o seu urânio. Ou seja, mesmo se o cientista pensar em coisas mais transcendentes serão sempre despresáveis em questão de tempo face ao projecto que tem entre mãos.

Concordo com o outro Victor no ponto em que aponta as responsabilidades para o poder politico. O Oppenheimer apenas fez o seu trabalho.

André, se não soubesses que estavas a fazer a bomba atómica, o teu paradigma cai por terra.

Nobel, Oppenheimer... quem será o próximo? Bomba de fusão nuclear? Bomba de neutrinos? Bomba de anti-matéria?

"Não sei como será a 3ª guerra mundial, mas a 4ª será com paus e pedras."
A. Einstein