Buenos Aires e o fim
Os dois bairros mais famosos de Buenos Aires são Santelmo, do anterior post, e a Boca onde se encontra o Caminito. Denominado Caminito pelo famoso tango de Gardel, é aqui que nasce o tango de uma mistura de todos os sons europeus que emigraram para aqui, com maior contributo italiano. Este era o bairro dos bordéis, era aí que os homens, primeiro entre eles e depois com mulheres, desenharam o que viria a ser o tango.
A Recoleta deve ser o cemitério mais famoso do mundo. E o mais caro também. Os gatos povoam o cemitério fazendo lembrar o mito egípcio, e a arte das campas é de deixar a boca aberta.
A Saturnália. O festival romano da falta de pudor é aqui representado de uma forma bem real, pelas feições simples das pessoas que o festejam e pela devassidão que deixa adivinhar. Sendo tão representativa valeu-lhe ser censurada nos tempos da ditadura e só recentemente exposta novamente. Está actualmente no jardim botânico de Buenos Aires. Com gatos por todos os lados.
Num leito de um rio, os sedimentos arrastados vão acumulando e fabricando pequenas ilhas. O tempo passa, as ilhas começam a crescer, já conseguem suportar casas. O homem começa a construir casas nas muitas pequenas ilhas e elas sempre a crescer. O resultado é a cidade de Tigre, onde as estradas são de água, os carros são barcos, existe o barco do gás, supermercado, o barco de levar os miúdos à escola... Mais à frente as casas acabam e passamos para uma zona que nos faz lembrar os documentários amazónicos, os mosquitos, a água barrenta, o silêncio. É um banho que nunca vou esquecer.
A nossa hostel em Buenos Aires e o porreiro que nos aturava as perguntas.
Tenho a sensação que quanto mais falo nesta viagem, mais perco o significado que teve. Não quero perder isso. Fez de mim uma melhor pessoa. Sair para um mundo, perceber que as prioridades que desmandam na minha vida não são o que realmente quero. É o que sempre me puseram na cabeça. Fazer o exercício de me tirar do centro do mundo. Perguntar-me a mim próprio quem ando a satisfazer pelo meu dia-a-dia. Perceber que o meu sorriso pode ser bem maior vindo de coisas que a nossa sociedade não valoriza. Perceber que se no fim morremos e termos sido egoístas, ou não, é igual, simplesmente não é verdade.
Se me perguntarem hoje, o que guardo na minha memória são as conversas. Foi onde aprendi mais. Nos exemplos daquelas pessoas, os pobres argentinos que não paravam de sorrir, os viajantes pelo mundo que aceitaram sem preconceito que a sua prioridade era viajar e conhecer o mundo. Foi falando com eles que percebi. A essência da vida é parar e pensar por nós próprios no que nos rodeia. E se estamos realmente felizes com isso. Os argentinos não precisavam de mais para ser felizes. Nós somos assim tão diferentes? Os viajantes esqueceram o emprego, a casa e o carro. A nós isso faz assim tanta falta? Foi na inveja da sua felicidade que me perguntei isto.
A Patagónia é um sítio sacana. Cada um tem a sua. Os pensamentos que derivam em cada um por estar naquelas paisagens enormes virgens, ver as árvores que têm tempo de nascer, crescer, e apodrecer no mesmo sítio, é diferente. Mas Patagónia cada um tem a sua. Espero que um dia possam descobrir a vossa.
Muito ficou por dizer, factos, sensações, pessoas, sorrisos. Acho que não nasci para fazer os outros viajar comigo. Acho que nunca ficaria satisfeito com o resultado. É preciso estar lá. Já sabem que gosto de ler o Cadilhe. O tipo tem jeito. Mas não é lendo que se percebe ou se muda. É passando pelo mesmo. E se já acham, como eu, fantástico, e se perdem nos mapas a ver onde é o sítio, acreditem, é um niquinho do que podem sentir viajando.
Viajar é a melhor oferta que o ser humano e o planeta Terra nos dão. Não se esqueçam desta frase. Fará sentido no final da vossa.
1 comment:
Viver outros mundos, noutros mundos. Acordar.
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