Monday, November 05, 2007

Índia

Estava calor e a fila tinha o condão de não diminuir. Havia a fila dos ocidentais, pessoas como eu, que jaziam debaixo do sol, rodeados por umas daquelas barreiras vermelhas em forma de grade de janela de prisão. Os Indianos, que nunca percebemos o que faziam... entre papéis e os seguranças Portugueses de uma distinta companhia de segurança privada que, de certeza, não tinham na sua fileira de habilidades um curso de nomes Indianos. Estes que se amontoavam naquilo que deveriam ser outras quatro filas.

Os seguranças vinham cá fora e gritavam um nome, primeiro em sílabas, depois com o contentamento de quem acertou no nome. Com uma confiança que só a eles enganava, berravam a viva voz o nome. KA....MIL.... MA.....NU....É... KAMIL MANUÉ!! Logo os Indianos disfarçavam em coro um riso abafado, enquanto um deles repetia o nome tão galantemente berrado pelo segurança, e claro, com o mesmo sotaque. A gargalhada vinha então, desta vez, por parte de toda a humanidade.

A porta fechava-se ao meio-dia. As pessoas saiam de dentro do incrível edíficio... vivenda. E o hall de entrada... o passeio da rua em frente ao edifício... vivenda. Os mais terríveis rumores corriam nas fileiras. A porta fecha e mais ninguém entra... estão lá duas pessoas para todas estas que se encontram aqui fora. Os seguranças embebidos daquele espiríto colonialista manejavam as folhas A4, crivadas de sílabas de fonética Indiana, como se fossem chicotes.

Respirei fundo. Duas horas de fila depois continuava com a velha inglesa que pensava que sabia falar Português à minha frente. À taxa de uma pessoa por hora seria impossível ser atendido... E a vista do rio Tejo misturada com a bancada do Belenenses já cansava... Meia hora mais tarde estava a entrar na agência de viagens, e do visto estou à espera.

Dia 10 de Novembro embarco na maior de sempre, 4 semanas na Índia. O ensaio na embaixada não correu nada bem. Encontrei-me com Graça Mexia por estes dias. Um amigo em comum apresentou-nos via números de telefone. A sabedoria de quem já passou lá 4 vezes sossegou-me o espírito, e ajudou-me a perceber como as coisas funcionam naquele país. Organizámos a viagem juntos, ela dizendo onde devia ir, eu perguntando pelo mais óbvio. Olhando aquela senhora de 70 anos que viaja desde sempre, sempre com duas amigas, e sempre usando dos métodos menos convencionais encheu-me de coragem para o que se avizinha.

A ideia romântica de ir à Índia desaparece na ponta de uma vacina e de uma velha que o que tinha de querida na voz tinha de bruta na picada. Nunca as palavras “estou cheia de pressa” me assustaram tanto. Depois é tratar de tudo, os sítios onde vamos, o mosquiteiro, o repelente, os comprimidos para desinfectar a água, os sítios onde há guerrilha... porque o espírito aventureiro do Europeu adapta-se nesta casa de bonecas onde todos vivemos. Nestes países, o valor da vida humana mede-se por um referencial bastante diferente... “Vais ter que levantar os pés para não pisares os mortos no chão...” É esta a imagem e o badalo que continuam a bater na minha cabeça.


(continua...)

1 comment:

britita said...

I have no idea what the text is about, except that its about India obviously, but just wanted to wish you a good and safe ;) trip. Take good care of yourself and return with lots of stories and tons of pictures!

PS: And always remember: Everything that doesnt move anymore is in one way or the other eatable ;)