Tuesday, December 20, 2005

Presidenciais e os erros de Sócrates

Cartoon in Revista Visão
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Antes de mais, é importante dizer que uma eleição presidencial é uma em que o valor individual do candidato está muito acima do partido que está por detrás. Quem vota, deve votar na pessoa e não no partido que o apoia. Quando olho o espectro da esquerda, vejo partidos, mais do que pessoas, em quem votar. Assim temos os "candidatos partidários", Jerónimo, Louça e Soares, e os "candidatos pessoais", Alegre e Cavaco. Cavaco como "pessoal" porque o apoio partidário vem depois do anúncio da candidatura, enquanto todos os outros nascem da vontade do partido.
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Quem olha de fora vê uma direita unida à volta do candidato natural, e uma esquerda completamente dividida. Das três forças políticas de esquerda, cada uma tem o seu candidato. Isso quer dizer que nenhum partido se identifica com o candidato de outro partido. Ou seja, existem três ideologias de esquerda diferentes no nosso país. Isto deve-se a dois factores. Primeiro o PS, e bem, que caminha cada vez mais para o centro. Segundo, uma renovação da esquerda forte, que vai acontecendo por toda a Europa, com os novos partidos a aplicar muitas das ideias de esquerda aos novos tempos que nos acompanham, ganhando aos Partidos Comunistas pela actualidade. Portugal é um dos poucos países em que o Partido Comunista ainda tem bastante força. Isto, na minha opinião, pela pouca credibilidade dos outros partidos de esquerda, e pela recordação do passado, que ainda não é geracional.
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E depois tem-se a candidatura teimosa. E esta é a mais interessante. Manuel Alegre sabe que não vai ganhar. Para mim, e para ele, é bem claro que Cavaco vai ser o próximo Presidente da República. Tirando essa motivação, que outra existe?
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Alegre não representa uma ideologia de esquerda como os outros candidatos, Soares, Louça e Jerónimo. E, mesmo sem o conhecer, acho que posso afirmar que não o faz por projecção mediática. Ele fá-lo para ensinar uma lição a Sócrates.
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Sócrates comete dois erros tremendos. O primeiro, e aí penso que foi bastante prejudicado pela ala mais à esquerda do partido, que dava como certo Alegre como candidato do PS, foi ter compactuado com o prelongamento da situação pouco clara. Não ter dito sim ou não logo à partida, quando se começou a falar. Isto deixa Alegre numa posição de noivo ofendido quando, mais tarde, se avança com o nome de Soares.
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O segundo é esquecer que a educação democrática dos Portugueses não está no seu ponto mais avançado. Os portugueses vão procurar penalizar o governo nestas eleições. E vejam o resultado final, Sócrates descarta Alegre e apoia Soares. Alegre candidata-se e torna-se o candidato natural para que se mostre o descontentamento pelo governo.
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Sócrates comete mais um pseudo-erro. Digo pseudo, porque tentar ganhar acaba por ser o seu dever político. Sócrates sabe Cavaco vai ganhar. Os Portugueses sempre seguiram a repartição de poderes, Cavaco é o futuro presidente normal no contexto político Português. Sabe também que haverá tendência para penalizar o partido do governo... e mesmo assim ele elabora a melhor estratégia possível para ganhar, que é ir buscar um peso pesado ao partido. Guterres, como pessoa esperta que é, vai esperar mais 2 mandatos para se candidatar. Quem sobra na esquerda? Soares.
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A questão aqui é saber se Soares é um candidato válido ou não. O povo gosta de Soares? Houve alguém, na sociedade, sem ser Sócrates, a clamar pelo seu nome? Apesar dos 80 anos, o povo vai apoiá-lo?
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A mim, apesar de não ser um "não" redondo, parece-me a resposta mais correcta. E era isto que Sócrates deveria ter visto. Soares não vai unificar a esquerda, não vai ser acolhido pelo povo em extâse de boas recordações... Soares não vai ganhar porque, neste momento, não tem credibilidade junto do povo, e para mais, é o candidato apoiado pelo partido do governo. Porquê elaborar uma estratégia vencedora, quando à partida sabe que vai perder? Porque não, só namorar Cavaco, como está a fazer, e bem, e deixar Alegre candidatar-se? A ala esquerda ficaria satisfeita, a figura de Alegre junta maior simpatia junto do povo, os penalizadores seriam menos, e Cavaco ganharia, como vai acabar por acontecer.
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Em vez disso, Sócrates recebe uma bofetada de luva branca, tanto de Alegre e da ala esquerda do partido, como dos Portugueses em geral. Ninguém vai falar disto, mas é uma grande derrota para o PS, haver um candidato de esquerda, não apoiado pelo partido, que tem mais votos que o seu canditado (Sondagem DN e TSF de hoje). O pior cenário, seria os outros dois de esquerda desistirem a favor de Alegre... Aí sim, a morada de Sócrates seria numa ilha deserta.
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Voltando ao primeiro parágrafo, seja porque razão for, a verdade é que os "candidatos partidários" se encontram em último, enquanto os que "candidatos pessoais" se encontram na frente. E isto deveria servir de lição aos partidos. Partidarizar eleições Presidenciais não é correcto, pelo menos nestas, ainda são as pessoas as mais importantes.

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