Portugal as ideias
Durante as viagens que tenho feito pelo norte da Europa tenho tido como principal sentimento a desilusão. Não existe um gene desenvolvido no norte que os faça comportar de forma mais civilizada do que em Portugal. Existe sim uma sociedade por detrás que os obriga a comportar uniformemente segundo as regras. Quando na Finlândia passou a haver uma lei que obrigava as pessoas a passar na passadeira e com o sinal verde, no dia seguinte ninguém passava. Foi a sociedade que colocou agentes de autoridade perto das várias, a passar multas às pessoas e a dizer-lhes o que tinham que fazer.
A população activa de Genebra é composta em 10% por emigrantes Portugueses. Houve um ano em que a chegada de Portugueses foi particularmente alta. Os jornais são vendidos em pequenas caixas espalhadas pela cidade, não existe ninguém para supervisionar a venda, espera-se das pessoas que deixem o valor do jornal numa pequena caixa que existe ao lado. Claro que, se pode retirar um jornal e não deixar qualquer pagamento. Os Portugueses quando chegaram, com ou sem informação, lá foram tirando o seu jornal sem deixar qualquer dinheiro. O facto foi notado, e logo cada caixa teve o seu representante do jornal à paisana, pronto a lembrar às pessoas que tinham que pagar o bem que estavam a consumir. Rapidamente o nível de pagamentos aumentou até ao anterior e assim se mantém até hoje, sem qualquer tipo de vigilância.
Para o xico-esperto dentro de cada um, pior que deixar escapar uma oportunidade de o ser, é ser apanhado a fazê-lo. Convinhamos, que maior parte das xico-espertices que vemos são por razões e para ganhos bastante mesquinhos.
Assim, globalmente não está na natureza humana ter um comportamento como o que vemos no norte da Europa. Está sim na natureza humana submeter-se às regras de uma sociedade. Desde que esta as imponha. Nos países nórdicos o não cumprimento implica matematicamente uma penalidade, porque já lhes aconteceu, já viram acontecer. Ou simplesmente cresceram numa sociedade em que todos já viviam segundo as regras.
A única diferença entre os nossos países, é que essa força motriz por parte sociedade que obriga as pessoas a cumprir as regras, não existe. Talvez por virmos de uma ditadura, talvez por termos incutido na nossa mentalidade que sabemos mais que os outros e não aceitamos que nos digam o que fazer. Talvez porque o Estado não tem meios. Os porquês neste contexto não interessam. O que interessa é a solução.
O facto de não haver uma força exterior que nos obrigue a cumprir as regras, obriga o Português a criar essa força no interior. Cabe a cada um ter um bom comportamento. Valorizar esse comportamento. Mesmo que ao lado o xico-esperto fique com mais 5 cts que nós, esse tipo de comportamento não pode ser valorizado pela sociedade. É esse o nosso maior problema. Alguém fez e ficou a ganhar, eu vou fazer o mesmo. É esse o ciclo da vida Portuguesa. Alguém fez, mas esse alguém é um xico-esperto.
Toda a minha vida ouvi falar mal de Portugal pela boca de quem lá vive. Certamente que a sobreposição dos universos das pessoas que falam mal e das que agem mal dá longe de um conjunto vazio. Falar é bom, mas agir é a única maneira de mudar algo. E a acção começa em cada um. Estamos num contexto em que falar mal é fácil. É em valorizar que está o mérito. É a valorização pela sociedade a força motriz que nos falta.
A população activa de Genebra é composta em 10% por emigrantes Portugueses. Houve um ano em que a chegada de Portugueses foi particularmente alta. Os jornais são vendidos em pequenas caixas espalhadas pela cidade, não existe ninguém para supervisionar a venda, espera-se das pessoas que deixem o valor do jornal numa pequena caixa que existe ao lado. Claro que, se pode retirar um jornal e não deixar qualquer pagamento. Os Portugueses quando chegaram, com ou sem informação, lá foram tirando o seu jornal sem deixar qualquer dinheiro. O facto foi notado, e logo cada caixa teve o seu representante do jornal à paisana, pronto a lembrar às pessoas que tinham que pagar o bem que estavam a consumir. Rapidamente o nível de pagamentos aumentou até ao anterior e assim se mantém até hoje, sem qualquer tipo de vigilância.
Para o xico-esperto dentro de cada um, pior que deixar escapar uma oportunidade de o ser, é ser apanhado a fazê-lo. Convinhamos, que maior parte das xico-espertices que vemos são por razões e para ganhos bastante mesquinhos.
Assim, globalmente não está na natureza humana ter um comportamento como o que vemos no norte da Europa. Está sim na natureza humana submeter-se às regras de uma sociedade. Desde que esta as imponha. Nos países nórdicos o não cumprimento implica matematicamente uma penalidade, porque já lhes aconteceu, já viram acontecer. Ou simplesmente cresceram numa sociedade em que todos já viviam segundo as regras.
A única diferença entre os nossos países, é que essa força motriz por parte sociedade que obriga as pessoas a cumprir as regras, não existe. Talvez por virmos de uma ditadura, talvez por termos incutido na nossa mentalidade que sabemos mais que os outros e não aceitamos que nos digam o que fazer. Talvez porque o Estado não tem meios. Os porquês neste contexto não interessam. O que interessa é a solução.
O facto de não haver uma força exterior que nos obrigue a cumprir as regras, obriga o Português a criar essa força no interior. Cabe a cada um ter um bom comportamento. Valorizar esse comportamento. Mesmo que ao lado o xico-esperto fique com mais 5 cts que nós, esse tipo de comportamento não pode ser valorizado pela sociedade. É esse o nosso maior problema. Alguém fez e ficou a ganhar, eu vou fazer o mesmo. É esse o ciclo da vida Portuguesa. Alguém fez, mas esse alguém é um xico-esperto.
Toda a minha vida ouvi falar mal de Portugal pela boca de quem lá vive. Certamente que a sobreposição dos universos das pessoas que falam mal e das que agem mal dá longe de um conjunto vazio. Falar é bom, mas agir é a única maneira de mudar algo. E a acção começa em cada um. Estamos num contexto em que falar mal é fácil. É em valorizar que está o mérito. É a valorização pela sociedade a força motriz que nos falta.
9 comments:
é, infelizmente, essa a ideia que se pode tirar daqui... o "xico-espertismo" é sem duvida o motor da nossa sociedade. nao sei se é a valorização a força que nos falta mas, nos ultimos tempos, nao tem existido muito por onde (ou o que) valorizar cá por estas bandas, daí ser tão facil falar mal.
a forma de dar a volta passa, quanto a mim, pelo apontar do dedo, pelo nao sorrir quando achamos que alguém nao está a ser correcto e apontar-lhe o dedo e dar-lhe cabo do juizo... Agora a questão está em saber se cada um de nós se está para chatear com isso...
abraço
vitor borges
Olá,
Chego aqui pelo blog da Nokas e achei este post fantástico. Pela forma clara como está escrito, pela sequência lógica do raciocínio e pela ideia que desenvolve. Parabéns, voltarei.Sofia
Hey! Não há nada como um bocadinho de divulgação para atrair novos visitantes! Agora deves-me um desafio! :p
(PS-tb gostei mto do texto)
Faltou referir a falta de espontaneidade e imaginacäo dos povos nórdicos. Todos cumprem e sempre viram cumprimr - é verdade. Mas também näo lhes passa pela cabeca outra coisa, como näo passa no resto dos pequenos-nadas da vida. (Neste caso, ainda bem). Para Portugal, o mais importante deixaste claro: parte de cada um. Näo fazer para ganhar, ou näo ser vencido, näo passar por cima de ninguém, näo repetir o que se vê à volta e, mais que tudo, näo fazer porque "toda a gente faz"... Porque é o melhor cantinho para se viver...
(Aproveito para dizer que gostei tanto tanto de como mostraste Lisboa: exactamente como mostraste todoas as outras cidades por onde tens passado. Acrescentando o "encanto", claro.)
Claro que tens razão!
E foi a mulher aranha que me trouxe até aqui.
Beijos
fizeste-me lembrar uma passagem d'os maias.
nos primeiros capítulos, se não no primeiro, afonso da maia diz que quer criar o neto (carlos da maia) longe da religião porque quer que ele seja um homem bom e que faça o que está moralmente certo por ser isso o correcto, não por ter medo do fogo eterno.
(não tenho aqui o livro, mas a ideia era essa)
esta tradição de seguir as regras a qualquer custo dá cabo de mim. quando cheguei à suécia a minha primeira desilusão foi descobrir que me diziam olá nas lojas e na rua não por serem simpáticos mas por ser suposto comportarem-se assim. acho desonesto.
e concordo que é necessário desvalorizar os maus-comportamentos. só assim se conseguirá alguma mudança de atitudes.
beijinho, moço.
Tocaste na ferida por diversas vezes.O nosso Portugal nunca irá sair da cepa torta, da modorra em que se encontra, é o País dos poucochinhos, dos vaidosos, dos que sabem tudo, dos melhores e dos maiores do mundo! Em tudo, claro! No futebol, nos recordes idiotas do guiness, das maiores gaffes, dos maiores erros.enfim! Já me esquecia, os maiores a matar animais na estrada, os maiores em maltratar os cães e gatos que por aí andam! E como não podia deixar de ser, os maiores em manter as tradições! Quais? A das praxes, que servem para o entrosamento da malta amiga, das touradas que servem para os turistas verem e para a nossa "socialite" na banca rota aparecer nas revistas e na tv, em qualquer canal, pois agora a tourada é para as massas!Somos os maiores sim, mas em atraso de vida e citando o autor do texto inicial, os maiores xicos espertos! Do Mundo, como não podia deixar de ser!
A questão da produtividade é bem lançada. É mesmo uma das maiores diferenças entre os países que tenho observado e o nosso, e uma das principais razões para ter escrito o que escrevi. Mas mais do que isso, é a percepção que fora de Portugal somos tão ou mais eficazes do quem nos acolhe que me faz pensar.
Isto abre dois pontos, um o da organização das empresas e da função pública em Portugal, o outro, a valorização que é dada a quem trabalha. O segundo ponto é o focado pelo texto em questão.
Enquanto cá fora quem não trabalha é posto de parte pela sociedade (desde institucionalmente até aos colegas de trabalho), em Portugal é aclamado e seguido. É esta completa troca de valores que refiro como principal causa para o estado do nosso país.
Fugindo a pontos de vista marxistas sobre a economia de mercado, as pessoas são postas de lado por uma maioria que simplesmente não entende porque se trabalha mais do que necessário. Em Portugal o marxismo funciona ao contrário. Cada um faz o menos possível para se proteger a si próprio. É esse o problema português e a minha maior frustação.
Se a produção não for valorizada pela sociedade, e já agora, se uma boa organização empresarial não for valorizada e seguida, os velhos costumes portugueses continuarão a dominar o modo de trabalhar Português.
O exemplo finlandês não é mal escolhido. Agora convem lembrar que os tipos foram o primeiro e único país a pagar tudo o que deviam ao países vencedores da guerra mundial dentro do prazo. Existe uma mentalidade de se ultrapassar a si próprio em tarefas fisicas e mentais.
Perante os exemplos dados como bons em Portugal, o caminho é tudo menos isso. A produtividade sem a valorização da mesma não dura muito.
A questão da produtividade é bem lançada. É mesmo uma das maiores diferenças entre os países que tenho observado e o nosso, e uma das principais razões para ter escrito o que escrevi. Mas mais do que isso, é a percepção que fora de Portugal somos tão ou mais eficazes do quem nos acolhe que me faz pensar.
Isto abre dois pontos, um o da organização das empresas e da função pública em Portugal, o outro, a valorização que é dada a quem trabalha. O segundo ponto é o focado pelo texto em questão.
Enquanto cá fora quem não trabalha é posto de parte pela sociedade (desde institucionalmente até aos colegas de trabalho), em Portugal é aclamado e seguido. É esta completa troca de valores que refiro como principal causa para o estado do nosso país.
Fugindo a pontos de vista marxistas sobre a economia de mercado, as pessoas são postas de lado por uma maioria que simplesmente não entende porque se trabalha mais do que necessário. Em Portugal o marxismo funciona ao contrário. Cada um faz o menos possível para se proteger a si próprio. É esse o problema português e a minha maior frustação.
Se a produção não for valorizada pela sociedade, e já agora, se uma boa organização empresarial não for valorizada e seguida, os velhos costumes portugueses continuarão a dominar o modo de trabalhar Português.
O exemplo finlandês não é mal escolhido. Agora convem lembrar que os tipos foram o primeiro e único país a pagar tudo o que deviam ao países vencedores da guerra mundial dentro do prazo. Existe uma mentalidade de se ultrapassar a si próprio em tarefas fisicas e mentais.
Perante os exemplos dados como bons em Portugal, o caminho é tudo menos isso. A produtividade sem a valorização da mesma não dura muito.
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